Daniel Ânderson Müller
Sentado em frente ao computador, já imagino entrar madrugada a dentro para tentar conjugar o verbo planejar. Tenho como companhia uma generosa xícara de café quente e o som de algumas de minhas canções favoritas. A idéia é resumir as aprendizagens significativas adquiridas durante as leituras acerca da importante tarefa de planejamento de ensino, atividade comum a todos os professores.
É o que eu planejo fazer. Planejar é quase sempre um verbo conjugado na primeira pessoa do singular. Trata-se, portanto, de uma ação individual essencialmente baseada no saber do professor. O saber docente, segundo Tardif (2002, p. 36), é “um saber plural, formado pelo amálgama, mais ou menos coerente, de saberes oriundos da formação profissional e de saberes disciplinares, curriculares e experienciais”.
Talvez seja pela experiência do professor que o planejamento de sua prática docente seja tão particular. Para tornar-se de fato um professor, o indivíduo passa por um processo de formação e aquisição de saberes que é comum a todos os profissionais da área. Mas a experiência não, ela é só dele, do indivíduo. Para contribuir com o raciocínio, Larrosa (2002, p. 27) diz que “o acontecimento é comum, mas a experiência é para cada qual sua, singular e de alguma maneira impossível de ser repetida”.
Dentro deste procedimento individual, cabe também a observação. Não só eu planejo, como tu planejas e ele(a) planeja. Neste momento, tento olhar o planejamento de ensino como uma ação que pode ser feita a partir de projetos anteriores. Verificando exemplos já realizados, fica relativamente mais confortável a tal ação individual de planejar. O problema, neste momento, fica por conta do risco que se corre de se incorrer nos mesmos erros antes cometidos.
Sendo assim, não pode faltar a reflexão crítica da prática docente. A educação é elemento de transformação da sociedade. E o professor é o principal agente desta transformação. Como cidadão, servindo como exemplo a seus alunos, o professor tem a obrigação de questionar, gerar dúvida e curiosidade. E será que as práticas docentes vigentes fazem isso? Penso que não. Shor (1986, p. 18-19) acredita que “o professor precisa ser um aprendiz ativo e cético na sala de aula, que convida os estudantes a serem curiosos e críticos... e criativos”.
Se eu planejo, tu planejas e ele(a) planeja, então nós planejamos. Penso que o grande desafio de um professor, quando se propõe a planejar suas aulas, é tentar unir o que já existe e já é praticado com novas práticas baseadas em seus próprios saberes. Mais desafiador ainda é conseguir adequar tudo isso aos critérios definidos pelo mercado e pela sociedade. Querendo ou não, os alunos estarão sempre sob a pressão e efeito do mercado e da sociedade. O professor deve ser consciente deste fato e buscar uma educação que prepare seus alunos a enfrentar a dura realidade, que envolve trabalho, dinheiro, política, diferenças sociais, conflitos ideológicos, etc.
Irei um pouco adiante nessa visão de planejar na primeira pessoa do plural. Vejo uma boa luz no que chamamos de interdisciplinaridade. Acostumou-se a tratar o conhecimento como se ele fosse dividido em áreas distintas e independentes. Quebrar este paradigma soma-se aos demais desafios do professor. Acredito que pensar a prática docente unindo os conhecimentos das mais diversas áreas possa levar os alunos a conquistar o saber. E além disso, adequar o conteúdo das aulas ao cotidiano pode criar significado e motivar os alunos a ter uma reflexão crítica de sua realidade e, consequentemente, compor um fator transformador desta realidade.
Vejo que não há receita pronta. Mas há escolhas. Posso resumir as opções ao empregar outros verbos ao verbo planejar, do qual falo neste texto. A primeira opção, a mais cômoda, é pensar o planejamento aliado às ações de apresentar, transmitir, reproduzir e decorar. A segunda opção, mais difícil e mais desafiadora, comporta maior quantidade de verbos e me parece muito mais agradável: conhecer, pesquisar, aprender, discutir, criticar, renovar, transformar, experimentar, criar, refletir, inovar... E que se acrescentem mais verbos!
Não sei se ao leitor este texto se mostrou esclarecedor. Para falar a verdade, eu não pretendia esclarecer nada. Muito pelo contrário, pensei em gerar dúvidas, mas incentivar a escolha por uma educação que você pode chamar do que quiser: integradora, libertadora, transformadora, reflexiva, etc. Escolha o nome que achar mais adequado, mas planeje sua prática de acordo, sem medo de errar. Errar é o risco que se corre ao ter uma postura inovadora. Mas que possamos aprender ainda mais com nossos erros.
REFERÊNCIAS:
CUNHA, Maria Isabel. Relação professor-aluno. In: Repensando a didática. Campinas: Papirus, 1999. p. 145-158.
LARROSA, Jorge. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. In: Revista Brasileira de Educação. Jan/Fev/Mar/Abr de 2002, nº 19. Disponível em http://www.anped.org.br/rbe/ rbedigital/RBDE19/RBDE19_04_JORGE_LARROSA_BONDIA.pdf. Acesso em 06 Jun 2009.
PERISSÉ, Paulo. O educador aprendedor. São Paulo: Cortez, 2004.
RIOS, Terezinha A. Ética e competência – 18ª ed. São Paulo: Cortez, 2008.
SHOR, Ira; FREIRE, Paulo. O sonho do professor sobre a educação libertadora. In: Medo e ousadia – O cotidiano do professor. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986. p. 11-25.
TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.

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